“Milhares de mulheres e homens sujos, de cabelos
desgrenhados e corpos esquálidos cercaram os jornalistas. (…) Os homens vestiam
uniformes esfarrapados, tinham as cabeças raspadas e pés descalços. Muitos,
porém, estavam nus. Luiz Alfredo viu um deles se agachar e beber água do esgoto
que jorrava sobre o pátio. Nas banheiras coletivas havia fezes e urina no lugar
de água. Ainda no pátio, ele presenciou o momento em que carnes eram cortadas
no chão. O cheiro era detestável, assim como o ambiente, pois os urubus
espreitavam a todo instante”.
Sim, isso aconteceu no Brasil. Mais precisamente em
Barbacena, Minas Gerais. O livro-reportagem Holocausto Brasileiro, da editora
Geração Editorial, conta a história do
maior hospício do Brasil, que ficou conhecido como Colônia e leva este nome por
ter abrigado atos de crueldade parecidos com os que aconteceram na Alemanha
nazista, durante a Segunda Guerra Mundial. Pelo menos 60 mil pessoas morreram
entre 1903 e 1980.
“Dei esse nome primeiro porque foi um extermínio em massa.
Depois porque os pacientes também eram enviados em vagões de carga (ao
manicômio). Quando eles chegavam, os homens tinham a cabeça raspada, eram
despidos e depois uniformizados”, explica a autora Daniela Arbex.
A Colônia foi inaugurada em 1903 e continua aberta até hoje,
mas o período de maior barbárie aconteceu entre 1930 e 1980, quando pessoas
eram internadas sem terem sintomas de loucura ou insanidade. Segundo o
livro-reportagem, cerca de 70% das pessoas não tinham diagnóstico de doença
mental.
Entre os absurdos praticados no local, muitas pessoas
passavam fome. Muitos comeram ratos ou pombas vivas. De tanta sede, bebiam
urina ou esgoto. Em períodos de maior lotação, 16 pessoas morriam por dia. E
isso dava dinheiro! A autora do livro conta que encontrou registros de venda de
1.853 corpos, entre 1969 e 1980, para faculdades de medicina. “O que a gente
não sabia e conseguimos descobrir, com a ajuda da coordenação do Museu da
Loucura, foi que 1.853 corpos foram vendidos para 17 faculdades de medicina do
País. O preço médio era de 50 cruzeiros. Dá um total de R$ 600 mil reais, se
atualizarmos a moeda.
Depois de algum tempo, o mercado deixou de comprar tantos
cadáveres. Os funcionários passaram, então, a decompor os corpos dos mortos com
ácido no pátio da Colônia, diante dos próprios pacientes, para comercializar
também as ossadas.
Hoje, o manicômio é mantido pela Fundação Hospitalar do
Estado de Minas Gerais (FHEMIG) e conta com 160 pacientes do período em que o
local parecia mais um “campo de concentração”. Ninguém nunca foi punido pelo
genocídio.
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