Olá mundanos,já faz tempo que queria fazer essa publicação um pouco mais completa,pois é um capitulo tenebroso na história do nosso país e por incrível que pareça,não consigo me conformar que mesmo a sociedade sabendo disso tudo os culpados quase não foram punidos,mas enfim esse é o nosso país onde alguém que tem dinheiro(entenda-se muito dinheiro)consegue escapar de quase todo delito cometido.
E o que aconteceu em Barbacena não fica muito longe do que aconteceu em campos nazistas,ou seja uma atrocidade contra a vida humana e falta de respeito com a vida tremendos!
Mas não vou me estender muito sobre isso,pois vários blogs falaram do ocorrido,inclusive parceiros muito queridos aqui do Meu mundo é assim.
Abaixo coloquei o trecho do livro O Holocausto Brasileiro da escritora e Jornalista Daniela Arbex,recomendo a leitura e já vou avisando que o livro é para quem tem estomago.
E logo mais abaixo um filme/documentário chamado Em nome da Razão,que mostra um pouco por dentro dos muros do 'Colonia'
"O repórter luta contra o esquecimento. Transforma em palavra
o que era silêncio.
Faz memória. Neste livro, Daniela Arbex devolve nome,
história e identidade àqueles que, até então, eram registrados como “Ignorados de
tal”. Eram um não ser. Pela narrativa, eles retornam, como Maria de Jesus,
internada porque se sentia
triste, Antônio da Silva, porque era epilético. Ou ainda
Antônio Gomes da Silva, sem diagnóstico, que ficou vinte e um dos trinta e quatro anos
de internação mudo porque ninguém se lembrou de perguntar se ele falava. São
sobreviventes de um holocausto que
atravessou a maior parte do século XX, vivido no Colônia,
como é chamado o maior hospício do Brasil, na cidade mineira de Barbacena. Como
pessoas, não mais como corpos sem palavras, eles, que foram chamados de “doidos”,
denunciam a loucura dos
“normais”.
As palavras sofrem com a banalização. Quando abusadas pelo
nosso despudor, são roubadas de sentido. Holocausto é uma palavra assim. Em
geral, soa como exagero quando aplicada a algo além do assassinato em massa dos
judeus pelos nazistas na Segunda Guerra. Neste livro, porém, seu uso é preciso.
Terrivelmente preciso. Pelo menos 60 mil pessoas morreram entre os muros do Colônia.
Tinham sido, a maioria,enfiadas nos vagões de um trem, internadas à força. Quando
elas chegaram ao Colônia,suas cabeças foram raspadas, e as roupas, arrancadas.
Perderam o nome, foram
rebatizadas pelos funcionários, começaram e terminaram ali.
Cerca de 70% não tinham diagnóstico de doença mental. Eram
epiléticos,alcoolistas, homossexuais, prostitutas, gente que se
rebelava, gente que se tornara incômoda para alguém com mais poder. Eram meninas grávidas,
violentadas por seus patrões, eram esposas confinadas para que o marido pudesse
morar com a amante, eram filhas de fazendeiros as quais perderam a virgindade antes
do casamento. Eram homens e mulheres que haviam extraviado seus documentos. Alguns
eram apenas tímidos. Pelo menos trinta e três eram crianças.Homens, mulheres e
crianças, às vezes, comiam ratos, bebiam esgoto ou urina,dormiam sobre capim, eram espancados e violados. Nas noites
geladas da serra da Mantiqueira, eram atirados ao relento, nus ou cobertos
apenas por trapos.
Instintivamente faziam um círculo compacto, alternando os
que ficavam no lado de fora e no de dentro, na tentativa de sobreviver. Alguns não
alcançavam as manhãs.
Os pacientes do Colônia morriam de frio, de fome, de doença.
Morriam também de choque. Em alguns dias, os eletrochoques eram tantos e tão
fortes, que a sobrecarga derrubava a rede do município. Nos períodos de maior
lotação, dezesseis pessoas
morriam a cada dia. Morriam de tudo — e também de
invisibilidade. Ao morrer, davam lucro. Entre 1969 e 1980, 1.853 corpos de pacientes do
manicômio foram vendidos para dezessete faculdades de medicina do país, sem que ninguém
questionasse. Quando houve excesso de cadáveres e o mercado encolheu, os corpos
foram decompostos em ácido, no pátio do Colônia, na frente dos pacientes, para
que as ossadas pudessem ser comercializadas. Nada se perdia, exceto a vida.
Pelo menos trinta bebês foram roubados de suas mães. As
pacientes conseguiam proteger sua gravidez passando fezes sobre a barriga para
não serem tocadas. Mas, logo depois do parto, os bebês eram tirados de seus braços e
doados. Este foi o destino de
Débora Aparecida Soares, nascida em 23 de agosto de 1984.
Dez dias depois, foi adotada por uma funcionária do hospício. A cada aniversário, sua
mãe, Sueli Aparecida Resende,epilética, perguntava a médicos e funcionários pela menina.
E repetia: “Uma mãe nunca se esquece da filha”. Só muito mais tarde, depois de adulta,
Débora descobriria sua origem. Ao empreender uma jornada em busca da mãe, alcançou
a insanidade da engrenagem que destruiu suas vidas.
Esta é a história que Daniela Arbex desvela, documenta e
transforma em memória,neste livro-reportagem fundamental. Ao expor a anatomia do
sistema, a repórter ilumina um genocídio cometido, sistematicamente, pelo Estado
brasileiro, com a conivência de médicos, de funcionários e também da sociedade.
É preciso perceber que nenhuma violação dos direitos humanos
mais básicos se sustenta por tanto tempo sem a nossa omissão, menos ainda
uma bárbara como esta.
Em 1979, o psiquiatra italiano Franco Basaglia, pioneiro da
luta pelo fim dos manicômios,esteve no Brasil e conheceu o Colônia. Em seguida, chamou
uma coletiva de imprensa,na qual afirmou: “Estive hoje num campo de concentração
nazista. Em lugar nenhum do
mundo, presenciei uma tragédia como esta”.
Quando começou a apurar a série de reportagens que marcariam
o nascimento deste livro, Daniela descobriu-se diante de um impasse. Seu filho,
Diego, tinha apenas quatro meses de vida. Ela tinha acabado de virar mãe, ainda
amamentava e colocava-se, por
vontade própria, no parapeito do horror. A repórter sabia
que mergulharia no inferno —e, de novo, aqui o inferno não é uma hipérbole.
Sabia também que, no inferno, não há fim de expediente. Um repórter, quando faz bem o seu
trabalho, é assinalado pelo que vive. A dor só vira palavra escrita depois de respirar
dentro de cada um como pesadelo.
Como repórter experiente, que, pela qualidade de suas
matérias, ganhou os principais prêmios nacionais e internacionais de jornalismo, Daniela
sabia o que se estendia diante dela. E, mesmo assim, fez a sua escolha. E o filho? Diego se
orgulharia dela.
Depois da série de reportagens publicada na Tribuna de
Minas, de Juiz de Fora,Daniela seguiu investigando. Viajava noventa e cinco quilômetros
até Barbacena, todas as manhãs, e voltava à tarde, já exausta pelo que viu e
ouviu, para iniciar a rotina no jornal. Entrevistou mais de cem pessoas, parte delas nunca
tinha contado a sua história.
Além de sobreviventes do holocausto, Daniela escutou o
testemunho de funcionários e de médicos. Um deles, Ronaldo Simões Coelho, ligou para ela
meses atrás: “Meu tempo de validade está acabando. Não quero morrer sem ler seu livro”.
No final dos anos 70, o psiquiatra havia denunciado o Colônia e reivindicado sua
extinção: “O que acontece no Colônia é a desumanidade, a crueldade planejada. No
hospício, tira-se o caráter humano
de uma pessoa, e ela deixa de ser gente. É permitido andar
nu e comer bosta, mas é proibido o protesto qualquer que seja a sua forma”. Perdeu o
emprego.
Umas poucas vezes, os esqueletos do Colônia subiram à
superfície. Passada a comoção pública, voltavam ao fundo empurrados pelas pedras
de sempre. Em 1961, a rotina do hospício foi contada na revista O Cruzeiro, pelo
fotógrafo Luiz Alfredo e pelo repórter José Franco. O título da matéria era: “A sucursal
do inferno”. Em 1979, o repórter Hiram Firmino e a fotógrafa Jane Faria publicaram a
reportagem “Os porões da loucura”, no Estado de Minas. O documentário Em nome da
razão, de Helvécio Ratton,filmado em 1979, tornou-se um símbolo da luta
antimanicomial.
No início dos anos 60, ao voltar para a redação de O
Cruzeiro depois de conhecer a Colônia, o fotógrafo Luiz Alfredo desabafou com o chefe:
“Aquilo não é um acidente, mas um assassinato em massa”. Apesar da denúncia estampada na
revista de maior sucesso
da época, a realidade só começaria a mudar – lentamente –
duas décadas mais tarde, a partir dos anos 80, quando a reforma psiquiátrica ganhou
força. Hoje, restam menos de 200 sobreviventes. Parte deles morrerá internada, parte
tenta inventar um cotidiano em residências terapêuticas, com os farrapos de delicadeza que
lhe sobram. Como Sônia Maria da Costa, que às vezes coloca dois vestidos porque
passou a vida nua.
Neste livro, Daniela Arbex salvou do esquecimento um
capítulo da história do Brasil.
Agora, é preciso lembrar. Porque a história não pode ser
esquecida. Porque o holocausto ainda não acabou."
Eliane Brum
Quando eu postei sobre esse tema no NS, ele acabou se tornando uma das postagens mais acessadas do blog...muito pela total falta de conhecimento que nós brasileiros temos a respeito de alguns capítulos da nossa história...
ResponderExcluirImpactantes as imagens...
Realmente Nando o que precisa não é divulgado na mídia,fiquei um pouco chocada quando vi as condições dos internos do hospício,degradantes demais...bom e o livro dispensa comentários mostra uma parte muito feia da história de nosso país e as imagens,são de causar repulsa,agonia,pena,enfim são lamentáveis.
Excluirque horror , não tenho outras palavras para definir essa barbárie que não é levada á conhecimento público.uma pergunta ;oque aconteceu com os responsáveis pelas internações?
ResponderExcluirA maioria ficou impune,,,
ExcluirChorando,aqui.Já senti isso na pele.
ResponderExcluirlembra muito o filme o bicho de sete cabeças de com Rodrigo Santoro.
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